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Paulinho Faria, o “Garotinho de Ouro”, por Chris Reis

Prólogo

Em 2015, Mencius Melo teve a ideia de fazer o Almanaque Garantido, livremente inspirado nos que existem com muita informação, curiosidades, fotos. Começamos as entrevistas. Fiquei com a missão de entrevistar Paulinho Faria, Zezinho Faria, entre outros.

O Almanaque não vingou, mas as entrevistas ficaram guardadas. Essa com Paulinho, feita na loja JP numa tarde regada a água e café, guardei com uma joia. Pensei em usar num dia especial, num momento único. Nunca imaginei que seria assim…

Não vou mudar o tempo e os verbos. Segue como foi concebida e guardada.

 

Chris Reis, jornalista, especial para Folha de Parintins

Paulinho Faria, o “Garotinho de Ouro”

Figura emblemática, Paulinho Faria foi durante 26 anos, o apresentador do boi Garantido, no Festival de Parintins. Oriundo de uma das famílias mais influentes da história do bumbá, o “Garotinho de Ouro”, como é chamado pela Nação encarnada, é conhecedor, porém também protagonista de inúmeras partes marcantes da festa folclórica.

Inovador, criou programas de rádio (quando não tinha nenhum), bordões que se imortalizaram e foi essencial para muitas vitórias, com seus lampejos de criatividade e improviso. Deixou o item número 1, após ter problemas de audição e dar lugar a Israel Paulain, seu sucessor natural.

Nas suas mais antigas lembranças, Paulinho recorda que um trabalhador de confiança do pai, Seu Manoel, o levava no colo para acompanhar o Garantido, nas suas andanças e o tio Bandieira, que era “padrinho” do bumbá, era chamado por seu pai para levar o boizinho para brincar na sua casa.  Além disso, também recorda, que sua mãe, por meio das lojas da família, foram responsáveis, durante anos, pelo dinheiro que entrava para colocar o boi para brincar. “Minha mãe fazia meu pai abrir o cofre mesmo. Ela foi a grande responsável pela ajuda que a família deu”, revela.

Muito organizado em suas memórias, lembra que 1973 começou a fazer um programa de esportes numa rádio. Num dia pegou um compacto  do cantor Chico da Silva, onde tinha a toada “Boi Garantido”. Sem perder a oportunidade, pegou o carro da loja da família e saiu bradando pelas ruas da ilha, que apenas o Garantido tinha música gravada. A rivalidade foi aguçada pelo programa, a ponto do contrário pedir um espaço aos donos da rádio. “Disseram não.  Falaram que rádio era católica e o meu programa não era de boi. Porém, falei que podiam ceder, desde que nós tivéssemos um programa do Garantido. E então, começaram os programas”, expõe.

O programa começou a fazer sucesso cada vez mais com Paulinho fazendo “molecagem” com o contrário, que tinha segundo ele, um programa “sem sal” e sem conteúdo. Ao saber de novidades do outro lado, anunciava na rádio, que era o Garantido fazendo e levava os contrários ao desespero.

A Galera vermelha e branca, já em clara sintonia com Paulinho, o viu num ensaio do dia 24 de junho de 1975, na arquibancada. O “empurraram” para o microfone e, no dia 28, estreava como apresentador.

Entre as frases de efeito, que deixou imortalizadas estão: a contagem “…1, 2, 3 e jááááá!”, “Quem é Garantido levanta o braço?”, “Só mais um pouquinho..só mais um pouquinho…”. Ressalta que todas estão registradas em cartório. Sobre “lerêrê..lererê…”, explica que foi uma criação de uma figura histórica, “Zé Fogueteiro”, criador do bailado corrido. “Ele já falava esse bordão, apenas introduzi no festival”, esclarece.

Paulinho sempre teve um estilo simples nas suas indumentárias, outra marca registrada: calça branca, blusa vermelha com a figura do Garantido. Quando as diretorias queriam enfeitar, protestava. “Nunca gostei desse negócio de encher de pena mina roupa. Gostava de ir simples. O Garantido é assim”, sentencia.

Em 1978, o Mestre Lindolfo Monteverde, o chamou e disse que queria entregar o boi a ele e pediu que não deixasse “os inimigos tomarem conta do Garantido”, recorda.

Sua história tem um capítulo especial para Chico da Silva.

Paulinho é enfático ao falar que foi Chico, o responsável  por fortalecer as toadas do Garantido. “Além de ter gravado a primeira toada de boi, que por sinal, era do Garantido, gravou depois “Verbena”, uma despedida. Ele sempre disse que a paixão musical estava no Garantido”, revela.

Em 1991, Paulinho pediu a Chico que fizesse uma toada para o boi encarnado, pois somente vinha fazendo músicas para o contrário. Um mês depois ligou para Paulinho e mostrou não apenas “Boi do Carmo”, como outras dez.

Ele destaca que a mais importante vitória de sua vida foi justamente em 1991, quando, a toada de Chico da Silva foi campeã, apesar de vários protestos de compositores, que não o queriam por ser do contrário. Ele ganhou ainda nos itens levantador e apresentador e o Garantido foi campeão.

Ele recorda suas palavras na arena. “Não temos dinheiro, mas fazemos a diferença com a cabocada da Baixa”. Ele mandou apagar as luzes do bumbódromo e a galera cantar “Boi do Carmo”. “Foi emocionante. Foi a melhor vitória da minha vida no Garantido”, conclui.

Em 2001, numa despedida dolorida, Paulinho deixava o posto de apresentador. “Na Copa de 94, soltei um foguete que deixou com sequelas no ouvido, que me fez perder 10% da audição. Entretanto, continuei e o presidente Raul Góes pagou um tratamento, mas era irreversível”, lamenta.

O irmão Zezinho Faria  indicou um garoto, que apresentava o Garanchoso, na festa de uma escola, era Israel Paulain. “Pedi que ele me chamasse à arena. Graças a Deus que indiquei um vencedor”,  comemora.

Paulinho tem o olhar crítico também. “Olhando para a dimensão que o Festival Folclórico alcançou, posso dizer que não sou contra a mudança, ou a evolução, que são necessárias, tem que evoluir, tem que melhorar sim, mas,  prezo pra que não se perca a tradição, a essência. A raiz da brincadeira não deve jamais ser esquecida, muito menos as pessoas que fizeram o Festival ser o que é hoje”, finaliza.

Homenagem a Paulinho Faria e a toda família Faria

Fotos: Acervo pessoal/Reprodução da internet

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